Quando tudo era nada e a existência se resumia na solidão divina, um conceptivo sopro rompeu o tédio, ressoando em criação, transformando o silêncio em verbo a escuridão em luz e o nada em tudo.
Dentre todas as galáxias originadas há uma um tanto diferente, é a galáxia de nada. Nesse pedacinho de universo de nada existe um astro de nada especial, o planeta de nada. Esse planeta de nada, que também é chamado de mundo de nada, é divido geopoliticamente em continentes, países, estados, cidades, bairros... Todos de nada. E é num desses locais de nada que nasceu a personagem dessa história de nada: o Homem de Nada.
Era uma vez o Homem de Nada. O Homem de Nada nasceu num hospital que não tinha nome relevante e ficava num bairro que ninguém nunca ouviu falar, de uma cidade desconhecida, situada num estado de peso econômico que não vale a pena ser citado. O horário ninguém sabia qual era, pois os relógios não marcavam tempo algum. Era um dia de nada de um mês sem comemorações, nenhuma data especial. O Homem de Nada foi abandonado antes de completar vinte e quatro horas de nada de nascido, mas logo foi acolhido por uma família riquíssima de nada, a família de Nada, que foi onde ele recebeu o nobre sobrenome.
Sua interiorana infância de nada foi maravilhosa. Cresceu cercado de livros cheios de estórias e conhecimentos de nada. Quando entrou no colégio de nada, já sabia ler muitas coisas de nada, o que o fez ser o primeiro aluno de nada da classe de nada. A professora de nada vivia lhe fazendo desimportantes perguntas:
- Senhor de Nada.
- Sim professora de nada.
- Me responda: quem descobriu nosso país de nada? – Sem pensar em nada o pequeno menino de nada respondeu.
- Ninguém professora!
- Muito bem! Está vendo classe de nada, vocês tem que ser de nada assim também! – O pequeno de nada abriu um sorriso brilhoso de orelha a orelha espalhando pela sala seu majestoso feliz semblante de nada.
Na adolescência as meninas de nada o adoravam pela sua inteligência de nada, o que o ajudou a ter algumas namoradas de nada. Prestou o vestibular de nada para Ciências de Nada na Faculdade Federal de Nada e foi aprovado em primeiro lugar de nada, o que o fez mudar da pequena cidadezinha de nada e partir para a grande megalópole, a capital de nada. Morou, junto com outros alunos de nada, numa república estudantil de nada onde, entre festas e estudos de nada, passou agitados dias de nada, memoráveis. Ainda cursando nada conseguiu um estagio de nada numa das maiores multinacionais de nada, a Indústria Nothing S/A. Determinado como era na vida acadêmica de nada, assim também foi no trabalho de nada e logo efetivou-se, e em sua carreira profissional de nada galgou muitos cargos de nada. Ascendeu ao nada muito rápido. Através de uma de suas amizades de nada, conheceu uma garota maravilhosa de nada, a Garota de Nada. Logo começaram um namoro de nada, que resultou em um casamento de nada. Quando terminaram a faculdade de nada (a Garota de Nada cursava Psicologia de Nada na Uninada, e diplomaram-se no mesmo ano de nada) mudaram-se para o interior de nada, queriam que seus futuros filhos de nada, que logo vieram em escadinha (Menina de Nada, Menino de Nada e Caçula de Nada), fossem criados longe da violência de nada que na grande cidade de nada tinha com fartura. Abriram um comercio de nada, que gradativamente prosperou. Suas crias de nada logo cresceram e seguiram os mesmos passos de nada do pai de nada, e foram estudar nada em outra cidade de nada numa das melhores instituições acadêmicas de nada. O casal de nada envelhecera sem perceber, e quando menos esperavam já eram avós de nada: nos finais de semana de nada os sete netos de nada enchiam a casa de nada de alegria nenhuma. Era uma grande felicidade de nada. Num dia de nada o Homem de nada, já aposentado de nada, acordou bem cedo e foi até a banca de nada comprar a Gazeta de Nada, voltou para casa de nada encheu sua canequinha de nada preferida com café de nada puro, sintonizou na Rádio de Nada que tocava suas modas de nada que tanto adorava, sentou-se como nunca na cadeira de balanço de nada, abriu o jornal de nada e morreu...
A família de nada juntou-se para o velório de nada no velho casarão de nada. Praticamente todos os moradores de nada da cidadezinha de nada seguiram pelas ruas de nada, cadenciados ao som do bumbo de nada, o florido cortejo de nada. Por fim, o defunto de nada foi sepultado.
Até hoje nessa cidadezinha de nada quem vai ao cemitério de nada e escuta o coveiro de nada contar essa história de nada, impressionasse, e fica mais curioso de nada quando lê o epitáfio de nada esculpido no marmoroso jazigo de nada: “Aqui jaz o Homem de Nada: um ser humano que representou tudo o que alguém pode ser na vida.”