No céu de São Paulo
nuvens chumbo prenunciam
a queda
que arrasta tudo alaga:
esgotos gastos
coletivos esgotados
casas ocas poços
restos fossas pastos
fossos poças
paços largos
logradouros
lugares comuns
Lago imenso lodo
onde Tristeza e Tragédia nadam nuas
sincronizadas
entre ratos-golfinhos
dejetos restos
e rostos
O trovão grita
rasga o ar:
Corre! A água é suja
imunda inunda
tua hora vai chegar
A sinfonia continua
no mesmo (des)compasso
até que a última gota
caia
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O MundoMundano se prepara para lançar seu segundo livro de contos, crônicas, poesias e afins, e eu tenho a honra e felicidade participar dessa segunda edição.
Todos estão convidados para a festa de lançamento.
Na pulsação dos sons
no sangue que se espalha por veias de luzes
minha vida corre
entre teus movimentos e
deságua
em teus beijos de nicotina
A palavra que lavra
o chão que gira profano
constrói o mundo
Mundo Mundano
Leia: www.mundomundano.com.br
Me põe no colo e me nina com canções de morte
Serve-me na boca papinha de corvos etílicos
Seu toque doce falso percorre meus cabelos
Faz meus olhos arderem envenenados
Hálito podre, sorriso indigesto
Tristeza me ama e quer que eu morra em sua poesia
Me consome em seu sexo frio e sem sons
Dorme com as mãos em meu pescoço
Tristeza queima meu peito com seu rosto
Corta minha pele com suas unhas negras
Sopra amarguras em meus ouvidos
Inventa amores que nunca terei
Ri desfigurada de prazer da minha dor
Exibe seus dentes de navalha enferrujada
Tristeza mora em minha alma frágil
E queima coisas que tenho no coração
Para mantê-lo vazio, espaçoso e solitário
Fiel, inseparável e indesejada
Come da minha morte diária
Tristeza não quer me abandonar
Mesmo eu dizendo que não a quero mais
Enquanto ela afia a faca de cabo branco
no esmeril perverso da indiferença
um coração pulsa sobre a pia
“plic, plac” o salto-alto indica sua aproximação
o coração oferenda acelera no altar
olha vidrada o alvo vermelho vivo
acaricia beija deseja fatia o músculo
Cheira o pedaço cuidadosamente retirado
lambe carne bebe vinho morde
Delicia-se: o prazer é o primeiro entre os sentidos
Cospe a matéria e fica só com o gosto da boca
lambe os dedos de olhos fechados acaricia-se
Ainda vivo pendura a sobra do coração na vitrine
para que a próxima faca exercite sua lâmina
No jardim do cemitério
As crianças mortas
Comem algodão doce
Nos narizes dos defuntos
E cavalgam nos anjos de mármore
Durante o recreio
Cercadas de uma paz estranha
Existem assim até o dia
Em que serão adultas
E terão suas almas
Sepultadas de vez
Para quê tantas lâmpadas
Frias ou incandescentes
E letras de neon falastronas
Se a noite há de ser escura?
O apagão acendeu
Meus primórdios
Em volta do fogo
Dancei
Comi carne
Bebi sangue
E após os rituais
Escrevi minhas guerras
No tempo
A Menina é um universo
Do qual eu quero fazer parte
Um Astronauta bobo
Girando em torno da estrela
O tempo passa
A vida voa
E a distância que nos marca
Aumenta a saudade em minha boca
Equidistante é a vontade
Que nossos olhares expressam
Ao fechar da noite
Num desgosto profundo
Que chegava amargar a boca
Cabisbaixo o moribundo
Levava sua vidinha oca
Enforcado no trabalho
Desgastada a relação
O Futuro é ilusão
“Nesse mundo sem perdão,
Quanto será que valho?”
Cansou-se do dia-a-dia
Sempre a mesma impressão
Casa, diploma, Mais Valia
Viagens, flores, pão
“Chega, chega disso
Já não quero compromisso
Com nada além do Além...”
Dirigiu-se até a ponte
E mirando o horizonte
Caminhou até a beira
Olhou o pé do monte
Impressionado com a ladeira
Pensou:
“Já que a morte vem
Um dia, pensado bem
Viver, que mal tem?”
Voltou à multidão
Pegou todo seu dinheiro
Mandou às favas o patrão
Abandonou a procissão
E hoje o nobre cavaleiro
Mora feliz no puteiro!
Atravesse na faixa
É para sua segurança
Nesse mundo sem esperança
Onde o amor está em baixa
Já não rio mais...
porque em teu curso correm negras minhas sobras
e em teu leito sereias mudas e perdidas
desencantam famintos estivadores de passagem
que sonham com suas ilhas
Marginais roubaram tuas plumas e deixaram-te
com a pior fantasia
Veia exposta que sangra restos
cadáver decúbito eternamente em decomposição
Tua beira escura e densa produz
um Narciso inverso
que se irrita por saber que os reflexos
que lhe mostra são
as ruínas de seus desejos
Difícil encarar teus olhos verdes-fossa
que tristes me suplicam pureza
Eu
Deus eterno e onipotente núcleo do tempo
a ti ignoro
pois sei que fiz de você minha
imagem e semelhança
Nus nós nos
Unimos e nos
Perdemos...
Nau na noite
Zunimos
Ninguém
Nada
Por perto
Do porto
Náufragos numa ilha
A desfrutar das maravilhas
Dos corpos celestes
As Três Marias
Assistem nosso brilho
Mania de olhar os amantes
A arte de versar; despertar o sentimento belo... poesia. A definição a ela dada, trancafiada no dicionário, serve só para alimentar os leigos. Vinho envelhecido sem rótulo, ela, traçando paralelos, redefine, mas nunca define nada; nem ela mesma. Rediz o dito, desdiz o redito, edita, mas nunca dita. Dito isso, a poesia mais do que sentimentos, ou a arte de evocá-los, ela é um sentido que se soma aos outros sentidos, e que se manifesta em poucos; um híbrido nascido da percepção e da expressão. Entre Amor e Humor, a poesia é Rumor.
Os Profetas, cartomantes, quiromantes, adivinhos, ou seja lá como forem denominados os que tentam prever o futuro, todos se dizem dotados de um sexto sentido. Invencionismos a parte, na poesia não existe charlatão, ou se é poeta ou não se é. Sem meio termo. O morno, na poesia, vomita-se. E quem afirma o poeta é a poesia, e não o inverso.
Metrificada, rimada, versada, nascida da música, o que gera uma tremenda ironia: um poeta sempre será um músico, mas um músico pode nunca ser um poeta. O músico toca um instrumento e o poeta com a poesia simplesmente toca. Pensando bem, acho que a poesia nasceu antes da música... muito antes até. As pinturas rupestres, que aprendemos a chamar de “desenhos”, talvez sejam poemas, as primeiras epopéias grafadas da história. Quem é que vai saber se eram (são) ou não? Ninguém. A ciência apenas deduz que são desenhos que representam o cotidiano, dedução que não quer dizer nada. Apenas arquivam essas informações no “P” de pictóricos, e p(r)onto. O pior é que nós nunca saberemos se a “poesia rupestre” está em prosa ou verso. É, os “homens das cavernas” são os primeiros poetas da humanidade, e a sua poesia vem sobrevivendo ao tempo.
A poesia marca o tempo em toda a sua dimensão.
O médico e o monstro, é assim a relação do poeta com a palavra. Mumificada pelos acadêmicos, exaltada pelos fanáticos eruditos, subvertida pelo provincianismo, empanada pelas mídias de massa, a palavra sofre suas variações, mas é na mesa de cirurgia do poeta que ela cria vida. Mutilada, recortada, colada, costurada, repensada e reproduzida, a palavra se cria em meio aos choques e se ergue em forma de poesia, e se torna criatura maior do que o seu criador. Fernando Pessoa, um Dr. Frankenstein que produziu vários monstros, misturado com Dr. Jekyll, que não conseguia conter seus arquétipos e se transformava no gigantesco Dr. Hyde, Pessoa foi tão minimizado pelas suas crias que sua existência humana é praticamente nenhuma; Ricardo, Alberto, Álvaro, será que já não esbarramos com eles por ai?
Nem as almas que suplicam por misericórdia vagam tanto atemporal pelo espaço quando a poesia.
A poesia transcende.
Nos gestos graciosos da dança, em pinceladas (a)simétricas, no equilíbrio da natureza, no marasmo do campo, no caos urbano, na carne, na guerra, a poesia caminha em silêncio pelos seus corredores sinuosos e mostra sua cara ao poeta em lampejos de inspiração, e utiliza-o como um caminho para tomar forma, criar imagem, som, sabor, saber. Sem saber, o poeta é só um instrumento que a poesia usa para se apresentar. A poesia é o mais poderoso arquétipo do inconsciente coletivo. O verbo é o princípio, a poesia um fim, e o poeta um meio.
Quando a sensação de vazio lhe atacar, e a guerra você versus você começar, escreva, pois é só a poesia querendo um dedo prosa.
"nós somos muito mais o que os outros acham que somos, do que aquilo que pensamos ser"
Dizem que a vida imita a arte... ou é a arte que imita a vida? Dizem... Ou será que vida e arte são coisas que se completam, contemplam-se e fundem-se, paralelas que passam a infinidade se cruzando, imitando-se? Vida, arte e teatro: sinônimos, não legalizados pela burocrática língua.
Acordo Eu, levanto filho, embarco passageiro, caminho transeunte, atravesso na faixa, sigo colaborador, atento estudante, pai, amigo, irmão, namorado, ator social que protagoniza e coadjuva ao mesmo tempo diversos papéis ao lado duma infinidade de outros. Genuflexório mudo atento me faz cristão. No carnaval, desfilando entre outros tantos outros, sou pierrô pagão. Tributo pago no balcão, duplicata em caixa, sou cidadão. Jungnianas personas que eclodem em meio a pensativos monólogos shakespearianos, sou pessoa, sou-me. Frente ao machadiano espelho, só, sou ninguém. Nada. Meu teatro é a vida encenada sem ensaio, sem roteiro, sem frases prontas e, pior, sem deixas, sem saber a hora certa de entrar em cena. Subjetivado réu, frente à platéia social, sou muitos, entre culpado e inocente.
O teatro é o oxigênio. É o oxigênio contido na água. É o oxigênio contido na água contida no aquário. É o oxigênio contido na água contida no aquário onde vive o peixe, que é dourado. É o oxigênio da água que mantém o dourado peixe vivo. O peixe vivo que vive no seu aquário-palco uma representação de ser: ser peixe dourado de estimação. O estimado peixe-ator, que desfila dourado em seu palco-aquário, repleto de pedrinhas coloridas e outros objetos de cena, representando para outro ser, enche de alegria e sentido a tola existência tediosa cotidiana de seu dono-platéia. Cercado de água contida de oxigênio-teatro, respira, alimenta-se, vive e representa o peixe-ator, dando sentido a feliz razão de ser ao seu dono-platéia, contemplando-o, com a arte de ser dourado.
O teatro é a mentira ensaiada. É a mentira que não fere. É a mentira gostosa de se ver e viver. E viver uma mentira que se gosta é viver uma verdade. O teatro é a verdade, que não passa de uma mentira ensaiada. Mentira que não fere. Que é gostosa de se ver e viver, porque ver e viver a verdade é bom, faz bem.
O teatro-vida é complicado. O choro sem ensaio dói. É um choro que punge verdadeiro, e que às vezes torcemos para que essa verdade seja uma mentira ensaiada. A mentira sem ensaio dói, fere. No teatro-vida, os aplausos são minguados, há mais apupos que tudo, decorrentes de sentimentos esmigalhados e poluídos no dia-a-dia pela ausência de amor... e ausência essa que, na maioria das vezes, erroneamente, é preenchida de matéria. As vezes é preciso deixar o teatro-vida de lado, descer do palco-mundo, despir-se do ator social que somos e sentar-se junto a platéia do teatro-arte, deixar o sonho fluir com a mentira ensaiada, cheia de calorosa verdade verdadeira, que transforma o choro-verdade que fere, em riso alegre que acolhe, meio a real sensação coletiva de felicidade. Na platéia do teatro-arte todos atuam com o papel de olhar e sentir. E eu, ator social destituído, quando desço do palco-mundo para ver atento o teatro-arte, que não só imita a vida, mas vai além dela, sinto uma alegria transcendente, que transborda o ser, e torço para que meu teatro-vida caminhe no mesmo sentido verdadeiro da representação que não fere. Vivendo esse coletivo momento feliz, farei de tudo para que no decorrer da minha peça, atuada no palco-mundo do teatro-vida, conquiste o doce beijo molhado infinito da suave e aveludada feminina boca desejada. E após o ato final, ao fecharem-se as cortinas e as luzes se acenderem, e ascenderem-me, eu receba e sinta os calorosos, acolhedores e recompensadores aplausos da platéia.
Texto publicado no blog Teatraria e no site do Itaú Cultural.
Todos os dias, ou quase todos, me descubro do Parahyba, levanto do Probel, só de Dog, dirijo-me ao banheiro, às vezes sento na Loqasa, às vezes não nesse horário, mas quando sento, depois do serviço feito, passo o Carinhoso nas nádegas, ligo a Corona, me esfrego, parte com Dove parte com Colorama, enxáguo-me, desligo a ducha, e me emaranho na Sisa. Depois de seco, passo Dope nas axilas, Natura nos braços, com a Sorriso passo Colgate nos dentes, às vezes passo Bozano na face e retiro tudo com Gillette, e passo, logo após, O Boticário. Terminado tudo, saio. Vou para o quarto, coloco a Zorba, visto a Hering, boto a Lee, calço as Adidas, com Granado dentro, e o par de All-Star sobre. Coloco o Iron-Man no pulso e o Nokia no bolso. Dirijo-me à cozinha, tomo Pilão com Jussara requentados no Dako, como Pullman com Qualit, encho o Tupperware com Tio João e Carioquinha, e junto, coloco a mistura que estiver disponível. O que sobrou guardo na Brastemp. Depois de cheia e bem fechada, a Tupperware, coloco-a na Bagmax, junto com Crime e Castigo, jogo-a nas costas, coloco o Sony nos ouvidos e saio de casa. Vou para o ponto e pego o Mercedes, que não é mais Amélia, mas continua sendo de verdade. Chego ao trabalho, ligo o Dell, atendo o Ericson, às vezes o Motorola, vendo Bomber, Bravox, Selenium, Stetsom, Golden Cabo, American-Auto e mais um monte de outras coisas. Todos os dias, no mesmo horário, como o que estiver dentro do Tupperware, às vezes com Coca-Cola, outras com Dolly, algumas com Tang ou Frisco. Depois como um Nestlé, ou chupo uma Kids, ou tomo um Kibon. Passado uma hora, volto à rotina. Finda o dia de labor, pego o Mercedes, às vezes vou tomar uma Brahma, ou uma Skol, às vezes vou usar Olla, às vezes vou direto para casa. Chegando, esvazio a Bagmax, descalço o All-Star e as Adidas, tiro a Lee, a Hering, a Zorba, vou para o banheiro e refaço todo o procedimento matinal, saio e visto-me. Para passar o tempo às vezes ligo a LG, às vezes ligo o LG, às vezes escuto o Toshiba, às vezes toco a Eagle ou o Tagima e em dias quentes ligo o Walita para refrescar-me. Antes de dormir programo o Nokia para acordar-me no horário certo. Deito no Probel, jogo o Parahyba por sobre mim e repouso com a cabeça no Zelo. E assim vai...
Às vezes a rotina muda, inventam novas necessidades indispensáveis à nossa vida cotidiana e junto com essas invenções novas marcas vão sendo inclusas em minha história.
Para ler:
Eu etiqueta - Carlos Drummond de Andrade
Para ver:
Coisa. Para mim a (ou o) Coisa sempre foi um super-herói, aquele, dos Quatro Fantásticos. Pelo menos era esse o nome deles, quando eu era criança. Hoje, acho, que os Quatro viraram Quarteto. E herói sempre foi para mim uma referência: Pai Herói, a novela da Rede Globo. André Cajarana, era o nome da personagem interpretada por Tony Ramos, que, segundo meus pais, foi a fonte de inspiração para a origem do meu nome. É ai que a coisa começa a ficar estranha. Bem, segundo os meus registros, nasci em São Paulo, bairro da Aclimação, no sexto dia do primeiro mês do ano de mil novecentos e setenta e cinco (século passado). A novela referida foi ao ar no ano de mil novecentos e setenta e nove! Nove? Isso mesmo, nove (Nº 9; para não ter dúvida). Caso meus pais não possuam uma máquina de viajar no tempo, não sei como explicar esse desencontro de datas. O pior é que nem eles sabem o por que desse desencontro. Talvez o tal Cajarana tenha provocado algum impacto na vida deles dois, sei lá... Também, mais de trinta anos vendo novelas é normal que já não saibam o que vem antes do que. Por falar em novela, faz tempo que não acompanho nada na televisão. Principalmente as novelas. Todas iguais.
Vendo TV outro dia, me chamou atenção uma reportagem sobre uma cantora brasileira radicada em Cuba, que não lembro o nome agora (e nem depois também), mas lembro que ela falava sobre música cubana, mostrou um DVD e fez um comentário. Quis adquiri-lo na hora, pois já tinha visto aquele num Sebo aqui próximo. Sabe come é, estou desempregado, tempo ocioso é farto (dinheiro + ócio = consumo), corri para loja. Procurei, mas não estava mais lá. Alguém já havia comprado. Mas ai, sabe como é, a besta-fera do consumo entra em cena! Não tinha o que eu queria, mas havia vários outros que eu queria, mas não sabia que estavam lá. O que era para ser uma compra de, no máximo, doze reais, virou uma de quarenta e cinco. Dois DVDs e dois livros. Cultura nunca é demais, segundo meu senso moral. Sem problemas também, logo estarei empregado, esse dinheiro não vai fazer falta agora.
Produto adquirido, mesmo não sendo o desejado, volto ansioso para ver algum dos filmes. Durante essa volta uma imagem me chamou atenção: um senhor, desses que aprendemos a chamar de catador-de-papelão, com roupas humildes, chinelos velhos e óculos escuros da... Coco Chanel!? Tudo bem, é falsificado, mas e daí! A sensação de beleza, importância, de fazer parte de algo não era falsa, era bem real. Quem diria em Gabrielle, que sua criação um dia estaria no rosto de um trabalhador negro como as lentes, de um dito país subdesenvolvido. A pirataria é a redemocratização da cultura, pois falso é o produto em si, não o sentimento com relação a ele, ou que ele proporciona.
Realidade. A realidade é só um recorte. Nem lembrava mais como a rua era movimentada assim. Também, só passava por aqui pela manhã, para chegar ao trabalho. Será que todo esse povo mora aqui? Ou só trabalham aqui? Ou estão passeando aqui? Eu moro, eles, não sei. Quantos ônibus lotados. Não sei se existe, na língua portuguesa, o coletivo de solidão, mas uma definição contemporânea de coletivo para esse substantivo seria: transporte público. Fico imaginando, milhões de pessoas indo e vindo, sem trocarem uma palavra! Quantos pensamentos passam por essas cabeças. Quantos sonhos, desejos, etc... Parecem zumbis; são apenas corpos, a mente, essa, ta longe... O Coletivo é uma espécie de mosaico de realidades, cada um com a sua. Arthur tem razão, a existência em si é um tédio, um vazio (chega logo ao seu destino ônibus...). Esse vazio justifica um outro pensamento filosófico (só não lembro o autor) que diz: o homem é o único animal que nega ser o que é; pretensiosamente completo: o homem é o único animal que nega ser o que é, e que só se reconhece no consumo, sua maior característica; anda, se alimenta, fala, pensa, etc., mas o que realmente o diferencia, até dos da mesma espécie, é o consumo, e é nesse último que ele se realiza.
A realidade não é em si a matéria, o trabalho e nem o outro, são as sensações que deles provem, entendida de forma subjetiva; como os padrões e entendimentos sociais se renovam, a realidade também é renovável. Como já dizia aquela letra do Raul: “que o mel é doce, é coisa que me nego afirmar, mas que parece doce, isso eu afirmo plenamente”.
Chega de observações do mundo exterior, vou ao que interessa, ver um dos filmes. O Escolhido foi um que mostra a vida do artista plástico estadunidense Jackson Pollock. O outro é um filme chamado Amnésia, muito interessante, mas como já havia visto, esse fica para outro dia.
Terminado o filme, vem a ansiedade. A ânsia de falá-lo a alguém é grande... Enquanto não encontro ninguém, fico com a angustia de ter consumido algo, mas como ninguém ainda esta sabendo disso, não considero ainda o consumo consumado.
Para entender melhor, algumas definições definidas por mim:
Desempregado: Estigma ruim; classificação dada à pessoa que não tem emprego.
Empregado: Estigma do Bem; classificação dada à pessoa que tem uma ocupação com registro em carteira de trabalho, e que dedica todo seu tempo à ascensão de outra da mesma espécie.
Catador-de-papelão: Estigma; classificação dada ao trabalhador que coleta materiais recicláveis pelas ruas, praças, avenidas, etc; filantropia.
Gabrielle Bonheur “Coco” Chanel (1883 – 1971), idealizadora.
Trabalhador: Estigma bom; classificação dada à pessoa que aplica sua ação (força) em algo, a fim de obter algum retorno financeiro; ocupação sem registro em carteira de trabalho; autônomo.
Pirataria: Ato de copiar e comercializar algum produto sem autorização de seus idealizadores; tendência neoliberal.
Redemocratização da cultura:Segundo Walter Benjamin e Siegfreid Kracauer (pensadores da escola de Frankfurt) as sociedades capitalistas avançadas criaram, sem querer, condições para uma democratização da cultura (processo de industrialização da cultura). A pirataria surge como renovação desse processo, pois mesmo com a cultura industrializada muitos ainda não tem acesso; acesso esse que é proporcionado através da pirataria.
Arthur Schopenhauer (1788 – 1860).
Faça, fuce, force– Raul Seixas.
Raul dos Santos Seixas (1945 – 1989).
Pollock(EUA, 2002).
Amnésia(EUA, 2000).
11/06/08
Texto acadêmico que fala sobre reificação, fetichismo, realidade, hiper-realidade, alienação e outras cositas filosóficas mas.
Baixe para ler:
O vazio da existência - Arthur Schopenhauer
Filosofando. Introdução à filosofia - Maria Lucia de Arruda Aranha
Para ouvir: